sábado, 15 de fevereiro de 2014

POR ORIENTAÇÃO DA PROFESSORA



Olá, visitante.

Na excelente obra didática Todos os textos: uma proposta de produção textual a partir de gêneros e projetos, de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães, 4 ed. volume para o nono ano, na seção “Agora é a sua vez!” de capítulo em que se estuda o gênero literário conto, os autores propuseram uma atividade de produção de textos aos alunos que estudam com esse volume da seguinte maneira:

Apresentamos a seguir o início de três contos de escritores brasileiros. Escolha um deles e dê continuidade à narrativa. Se preferir, escreva um conto com um assunto diferente dos propostos.

Depois da proposta apresentada, em sequência e logo após conceito de Horacio Quiroga relativo ao conto literário, Cereja e Magalhães puseram o início de três contos, sendo o primeiro de Otto Lara Resende, o segundo de Sérgio Sant’Anna (ambos integrantes do livro Os cem melhores contos brasileiros do século, organizado por Italo Moriconi e publicado em 2001), o terceiro de Wander Pirole (incorporado ao O novo conto brasileiro, obra de autoria de Malcolm Silverman publicada em 1985).

Dos três fragmentos selecionados pelos autores da obra didática, transcrevo a seguir o segundo, o de Sérgio Sant’Anna, para que você, meu leitor, o conheça, a fim de que compreenda minha motivação para esse meu ato transcritivo, o qual se tornará mais claro logo mais abaixo.

Ele se encontrava sobre a estreita marquise do 18º andar. Tinha pulado ali a fim de limpar pelo lado externo as vidraças das salas vazias do conjunto 1801/5, a serem ocupadas em breve por uma firma de engenharia. Ele era um empregado recém-contratado da PanamericanaServiços Gerais. O fato de haver se sentado à beira da marquise, com as pernas balançando no espaço, se devera simplesmente a uma pausa para fumar a metade de cigarro que trouxera no bolso. Ele não queria dispensar este prazer misturando-o com o trabalho.

Quando viu o ajuntamento de pessoas lá embaixo, apontando mais ou menos em sua direção, não lhe passou pela cabeça que pudesse ser ele o centro das atenções. [...]

Conforme destacamos acima, Cereja e Magalhães propuseram a alunos do nono ano, cujos estudos de produção textual se realizam com a obra de ambos destinada à produção de textos, que dessem continuidade a um dos três fragmentos iniciais de contos dos autores brasileiros supra identificados.

Tenho um filho de quatorze anos chamado Miguel. Miguel está cursando o nono ano do ensino fundamental e estuda produção textual com base no volume informado de Cereja e Magalhães. Em sala de aula, a professora de produção textual de Miguel pediu que ele e seus colegas realizassem a atividade proposta na seção “Agora é a sua vez!”, existente no livro com o qual estudam. Miguel selecionou, para cumprir sua tarefa, o fragmento inicial do conto de Sérgio Sant’Anna. Trago a você, leitor, a seguir, essa produção de Miguel Araujo.

Ficou confuso, sem saber o que fazer. Ouviu um homem de meia idade gritar em sua direção:

- Não faça isso, pense nos seus filhos! Quer deixá-los sem pai?!

“Mas eu nem tenho filhos”, pensou o empregado. Não estava entendendo aquela situação, afinal, o que ele havia feito de errado? Era apenas um trabalhador honesto tentando se sustentar e arranjar dinheiro suficiente para pagar o tratamento de sua mãe, que possuía câncer. Existe algo de errado nisso?

Foi então que juntou as peças do quebra-cabeças: aquelas pessoas na calçada achavam que ele se suicidaria. Tentou explicar que não pularia da marquise, mas não sabia como, pois as pessoas estavam muito distantes. Olhou para baixo e avistou dois carros encostando perto da multidão: um era da polícia e o outro era da TeleNews, um telejornal famoso na cidade. “Isso não vai dar certo”, concluiu o empregado. Um policial baixinho pegou o megafone e anunciou:

- Senhor, colocaremos um colchão pra você pular aqui!

Irritado, o empregado deu de ombros e fez uma coisa que ninguém imaginava: entrou no prédio e voltou a trabalhar. Ainda era possível ouvir as pessoas lá embaixo lamentando, pelo menos algumas delas.

Não posso saber, leitor, o que pensará dessa continuidade após lê-la, a menos que se permita brindar-nos com um comentário aqui. De minha parte, destaco três aspectos que me pareceram relevantes na produção de Miguel Araujo.

O primeiro está relacionado à noção de contexto; sem essa noção, sem a compreensão de que os fatos se circunscrevem em eventos contextuais, ele não teria conseguido complementar a contento os parágrafos iniciais por ele selecionados.

O segundo me apareceu na presença de certo humor, quase ironia, na situação que criou, baseada na confusão gerada pelo fato de o operário sentar-se “[...] à beira da marquise, com as pernas balançando no espaço”[...], somente para se deliciar com umas tragadas em meio cigarro, e por conta disso despertar nas pessoas que o viam reações do tipo “- Não faça isso, pense nos seus filhos! Quer deixá-los sem pai?!”, ao que ele, operário, reage (risonho?), pensando “Mas eu nem tenho filhos”.

O terceiro está diretamente conexo a sua percepção do quanto muitas pessoas podem carregar dentro de si o desejo do trágico, do sinistro, do nefasto, do patético, quando seu narrador declara (incrédulo?), na última linha, a reação das pessoas, após perceberem que o trabalhador entrava no prédio para retomar sua atividades: “Ainda era possível ouvir as pessoas lá embaixo lamentando, pelo menos algumas delas.”.

São olhares meus! E você, leitor, o que diz a respeito?

Até breve.

2 comentários:

  1. Esses aspectos que você destacou me surpreenderam no texto de Miguel, sobretudo a ironia e a percepção desse lado "sinistro" do ser humano. Realmente me impressionou.

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  2. Pois é, Aninha. Miguel tem realmente características que surpreendem, impressionam mesmo. Tem uma percepção de mundo extraordinária.

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